Perfil de Molécula: Zach Arundel

Se nos pedissem para resumirmos o trabalho de Zach Arundel em duas palavras, essas duas palavras seriam "ser minucioso". Como um cientista de dados, ele passa o seu tempo a contar, voltar a contar e depois analisar e avaliar grandes montantes de dados sobre Dreams e sobre o Dreamiverso. No entanto, é tempo bem gasto, dado que ajuda a informar em que funcionalidades de jogo a Mm trabalha, e como respondemos às necessidades da coMunidade. Aqui, conversámos com ele sobre as suas primeiras buscas na internet, síndrome do impostor, e o período em que ele trabalhou definitivamente para o MI5. Talvez.

Olá Zach! O que fazes aqui na Media Molecule?

Uma foto de Zach Arundel.

Uma foto de Zach Arundel.

Sou um cientista de dados na Mm, o que é um cargo recentemente criado com origem no final da década de 2000, quando os dados se tornaram em algo com os quais as pessoas se começaram a importar. Basicamente, eu faço muitas contagens e avalio o comportamento dos nossos jogadores, e resume-se a descobrir quantas vezes algo aconteceu - por exemplo, quantas vezes os jogadores saltaram em um nível, ou quantos colecionáveis encontraram antes de desistirem de os tentar descobrir. Por isso, analisamos muita jogabilidade e interações de jogadores nos lançamentos de criações da Mm, trabalhamos muito com a equipa de curadoria, fazemos muitos testes A/B e experiências de controlo aleatórias. Ajuda a informar no que vamos trabalhar a seguir, e como responder ao feedback dos jogadores e da coMunidade.

Como é que esses dados são utilizados após serem recolhidos?

Bem, essa é provavelmente a parte mais divertida do trabalho, quando se fala com os designers e com a equipa sobre o jogo que lançaram, e basicamente, se faz um resumo do que teve êxito e do que não funcionou. Usando esta informação, podemos descobrir como desenvolver os nossos sucessos para o que quer que venha a seguir, e descobrir formas orientadas pelos dados para tornar as nossas criações mais atraentes para os jogadores. Obviamente, fazemos muita investigação de utilizadores, dado que sem esta, não se sabe necessariamente como os jogadores e os criadores estão a responder às adições e atualizações que colocamos no jogo. Dito isto, as nossas equipas de design são muito experientes e conhecem o seu público alvo, e como tal, já possuem uma boa intuição no que se refere aos pontos de fricção, e aos aspetos mais problemáticos dos nossos jogos que possam afastar certos jogadores.

Nepheline e Gabbro, os gémeos orc que se tornaram em estrelas no jogo Ancient Dangers: A História de Um Morcego, da Media Molecule.

Nepheline e Gabbro, os gémeos orc que se tornaram em estrelas no jogo Ancient Dangers: A História de Um Morcego, da Media Molecule.

Tu fazes análises regulares para ver quais são os pontos delicados para os jogadores?

Sim, nós fizemos algumas em Ancient Dangers: A História de Um Morcego, que teve lugar no início da minha carreira na Mm. Foi um desses acontecimentos gratificantes em que eu olhei para o progresso de jogadores ao longo de Ancient Dangers e conversei com alguns designers sobre como poderíamos melhorar algumas partes problemáticas. Em quase qualquer outro jogo, isto seria um processo normal, mas Dreams é uma plataforma interessante na qual tudo o que se faz nele compete diretamente com todas as outras criações no Dreamiverso, e como tal, existe uma competição indireta no sentido em que pode existir uma criação melhor para jogar. E são todas gratuitas, o que faz com que não exista nenhuma barreira que nos impeça de desistir e procurar outra coisa. Por isso, temos de ser um pouco mais generosos para com os jogadores, e talvez não tratar as criações como algo tipo, 'Olá, acabaste de gastar 50€ neste jogo novo, por isso vou-te dar aqui umas sequências de vídeo, e depois vou fazer com que o jogo seja muito difícil'. Eu penso que o aspeto mais interessante foi que as coisas que encontrámos em Ancient Dangers, foram todas problemas que os designers reconheceram, mas quase que se esqueceram deles no processo de desenvolvimento.

O trailer para Ancient Dangers: A História de Um Morcego, para o qual o Zach fez a análise de dados.

Mas a programação de jogos é tão difícil e as coisas mudam tão rapidamente. E surge sempre um problema novo, mas tens de continuar a avançar, para não parar outras partes do desenvolvimento. Mas o lado positivo dos dados e da pesquisa de utilizadores é que podemos ver coisas de uma nova perspetiva, impossíveis de ver na altura da criação. Quando se lança o jogo, eu penso que já nem se consegue ver onde estão os problemas, dado que o jogo mudou tanto desde que se começou a criá-lo há tantos anos atrás. Tudo o que se vê é este produto no qual se empreendeu tanto esforço, e eu penso que só se consegue vê-lo de novo quando conversamos com investigadores ou quando se fala de análises, o que nos fornece outra perspetiva. E quando se vê as pessoas a jogarem o jogo e as suas impressões dele, uma pessoa pensa, 'Sim, se calhar podia-se mudar isto'.

Por isso, a parte mais divertida do trabalho é falar com os designers e oferecer-lhes informações para que estes voltem a desenhar o jogo na sala connosco - é algo muito recompensador, e sentimos que estamos mesmo a participar e a melhorar a experiência de jogabilidade para os utilizadores. Mas todo o trabalho árduo e os ajustes acabam por compensar, dado que mais tarde, conseguimos lançar uma atualização para Ancient Dangers que resolveu bastantes problemas que foram descobertos pelos jogadores quando conduzimos pesquisas e análises de utilizadores.

É interessante teres mencionado as sequências de vídeo como potenciais barreiras para os jogadores. Em termos de dados, as sequências de vídeo longas no início de uma criação, tendem a a ser mal recebidas por parte dos jogadores?

Uma captura de ecrã de Ancient Dangers: A História de Um Morcego, com alguma ação a derrotar monstros.

Uma captura de ecrã de Ancient Dangers: A História de Um Morcego, com alguma ação a derrotar monstros.

Sim, tem um grande impacto. Eu não quero contribuir para que alguém deixe de as criar - tipo, se a vossa visão for a de criar uma grande abertura, devem criá-la - mas isso pode-vos custar jogadores que não estejam muito interessados numa experiência narrativa. Não é um problema se realmente não for o que querem jogar, mas eles nunca saberão se iriam gostar das vossas criações porque não estavam preparados para receber o que vocês lhes estavam a vender, e talvez até estivessem recetivos mais à frente. Talvez seja algo grosseiro, mas Dreams é um local muito tentador. É como um miúdo numa loja de doces. Se vocês forem bons vendedores, não escondem os vossos melhores doces por detrás de uma embalagem complicada e cinco minutos da história do doce - vocês fazem com que o doce salte à vista para que os miúdos corram logo para eles com água na boca. Depois, como um brinde, talvez ofereçam um pouco de história, para que os jogadores fiquem a saber um pouco sobre o jogo.

Alguma vez descobriste dados muito estranhos ou inesperados sobre Dreams?

Eu estava a olhar para as pesquisas mais populares, e os jogadores de Dreams estão interessados especificamente em criaturas tipo dinossauros gigantes. Tipo, monstros gigantes de tamanho de kaiju. Eu até gostaria de ver como seria um diagrama Venn dos fãs de dinossauros e da coMunidade da Mm. A mistura de Sackboy com um monte de dinossauros reproduzidos realisticamente parece ser algo substancial do qual eu não estava à espera. Quer dizer, obviamente, eu adoro destruir coisas, e os dinossauros têm um visual fantástico, mas o Dreamiverso está cheio deles.

Uma captura de ecrã de Ancient Dangers, em que o feedback de utilizadores ajudou o Zach, juntamente com a equipa de desenvolvimento, a criarem melhorias no jogo.

Uma captura de ecrã de Ancient Dangers, em que o feedback de utilizadores ajudou o Zach, juntamente com a equipa de desenvolvimento, a criarem melhorias no jogo.

A minha teoria é que explorar o Dreamiverso é como a primeira vez que se usa a internet. Eu lembro-me de estar na escola na hora do almoço e ficar sentado em frente a um computador e me deixarem navegar livremente (com a pesquisa segura ativada, obviamente). Eu nunca tinha usado a internet antes, por isso, olhava para o meu colega e copiava-o, a escrever bbc.com e isso. A página web da BBC deve ter sido a primeira página que, tipo, 90% das pessoas no Reino Unido visitaram para além de, por exemplo, a do Google. Depois disso, na vez seguinte em que usei a internet, eu escrevi algo estúpido tipo salsichas.com. Eu penso que as pessoas têm esse momento em Dreams em que olham para a barra de pesquisa e escrevem o que lhes vem à cabeça. Para muitas pessoas, parece ser algo fantástico como dinossauros, mas aparentemente, para mim é salsichas.

Então, como é que chegaste à Media Molecule? Já trabalhavas na ciência de dados há algum tempo?

Eu trabalhava para o governo do Reino Unido, e também trabalhava na ciência de dados lá. Mas apenas fazia vários trabalhos de governo aborrecidos, os quais comecei a gostar cada vez menos. Ao longo do tempo, foi aumentando este interesse na ciência de dados dentro do governo, e tornou-se algo a que considerei dedicar-me. Não o fiz por muito tempo, mas já que consegui obter as competências em ciência de dados quando lá trabalhei, eu pensei em tentar conseguir obter o meu emprego de sonho, que é trabalhar num estúdio de videojogos. Assim, candidatei-me à Mm, e aqui estou!

Bem, diz-nos a verdade. Eras um espião?

Toda a gente pensa que eu estava no MI5. E quanto mais eu faço com o que meu emprego anterior soe aborrecido, mais as pessoas se convencem que eu estava no MI5, mas não. Eu trabalhei em gabinetes de ministros do governo durante algum tempo, o que foi muito divertido por poder ouvir bons boatos - era como um episódio de O Centro da Questão. Mas um dia, eu tive um dia péssimo no meu emprego anterior, e disse para mim mesmo, Ok, agora tenho de procurar empregos relacionados com jogos. Felizmente, a Mm estava a recrutar, e o meu sonho tornou-se realidade.

Está bem, mas nós vamos ter sempre estas suspeitas. Tu estudaste ciência de dados?

Para dizer a verdade, eu tirei um curso de química com más notas, e como tal, a minha transição para a ciência de dados foi completamente alheia à minha licenciatura. Como tal, sou autodidata em ciência de dados, mas tive a sorte de conseguir entrar para o meu emprego nesse ramo, e depois aprendi tudo o resto nesse emprego. Eu penso que todos os empregos têm algum nível de síndrome de impostor, mas a ciência de dados é muito má para isso porque muitas vezes, trabalha-se com gente muito inteligente e eu ficava com medo de não ser tão inteligente como eles. Mas só se tem de encontrar uma equipa que aceite as variações nas áreas de especialização.

Eu costumava trabalhar numa equipa com alguém que era muito bom em estatísticas, ao ponto de me fazer voltar a avaliar tudo o que eu pensava que sabia sobre números. Mas era uma excelente relação profissional, dado que essa pessoa conseguia fazer tudo relacionado com as estatísticas e me ensinava a melhorar, enquanto que eu trabalhava no lado da engenharia.

Outra captura de ecrã de Ancient Dangers, com o modo Frenético, o qual os jogadores parecem adorar. Talvez porque vos permite DESTRUIR TUDO?

Outra captura de ecrã de Ancient Dangers, com o modo Frenético, o qual os jogadores parecem adorar. Talvez porque vos permite DESTRUIR TUDO?

Que tipo de ferramentas e análises usas no teu dia a dia?

Nós trabalhamos com os nossos programadores para colocar ligações de telemetria que conseguem denunciar dados de jogadores interessantes quando algo acontece. E isso é enviado para uma base de dados antiga e bem grande, e eu digito consultas SQL o dia inteiro. Por isso, para aqueles que estejam a pensar em tornarem-se cientistas de dados, basta tornarem-se bons com SQL e já têm 80% do que é preciso. E se isso parece intoleravelmente aborrecido, procurem outra coisa. Acontece que eu gosto de escrever em SQL.

Aprende-se SQL, cria-se a base de dados, e depois executa-se o script em Python que é o que faz com que a magia aconteça. Todos esses dados criam uma grande confusão, e essa é a maior parte do trabalho, arrumar tudo e certificar-me de que tudo faz sentido quando removo os 'valores atípicos'. Depois, apresenta-se o resultado às pessoas relevantes, e certificamo-nos de que elas entendem tudo para que possam dar seguimento a isso e melhorar o jogo.

Tens outros conselhos para dar às pessoas que estejam interessadas na ciência de dados?

Sim. Aquela parte que mencionei anteriormente sobre aprender no emprego é incrivelmente importante. Eu tive um grande mentor em um dos meus empregos. Eu era um pouco como um vampiro, a sugar todo o conhecimento que me ofereciam. E toda a gente diz isto nas entrevistas, mas: mostrem que têm uma enorme paixão por qualquer que seja a área em que entrem. As pessoas gostam disso. Ajuda muito interessarem-se por aquilo em que trabalham, dado que eu seria 90% pior no meu emprego se não trabalhasse no Dreams. Mas eu adoro Dreams, e adoro toda a gente que joga Dreams, e interesso-me por aquilo que essas pessoas querem fazer. Nos meus empregos anteriores, eu não queria saber porque é que as pessoas usavam as páginas de internet, porque não me interessava. Mas videojogos e Dreams significam tanto para mim que acabo por me interessar por aquilo que as pessoas fazem, e eu quero mesmo fazer com que se torne em algo melhor. Por isso, encontrem algo que vos interesse verdadeiramente, e preocupem-se com os utilizadores, e isso vai fazer de vós melhores cientistas de dados.

O pessoal da Mm parece ter vários itens interessantes nas suas secretárias. O que tens na tua secretária neste momento?

O estado da minha secretária é um motivo de discussão constante com a minha esposa, porque eu como muitas clementinas, especialmente nesta altura do ano. Mas também gosto de comer a casca da laranja, que tem de ser comida lentamente, porque é muito azeda. Como tal, a minha secretária está sempre repleta de laranjas em diferentes estados de consumo. Deixa uma fragância a laranja agradável, mas fica muito suja.

Tenho alguns livros que estão colocados estrategicamente, porque esta divisão também serve de quarto das visitas, ou não, caso a visita seja o meu filho pequeno. Mas os livros estão aqui para dar a impressão que uma pessoa inteligente trabalha aqui ocasionalmente.

Para terminar, quais são os teus Sonhos preferidos, e há algum que gostarias de recomendar?

Uma captura de ecrã de Dead Dreams 2.

Uma captura de ecrã de Dead Dreams 2.

Eu queria escolher aqueles que ainda não receberam muita atenção, o que excluiu alguns dos meus preferidos, mas como eles já são adorados por muitos, é o que é. Assim sendo, DEAD DREAMS 2 (de SmileBasic) é um deles. É basicamente uma coleção de todas estas criações inacabadas e é muito generosa porque tem umas 29 coisas lá dentro, mas são todas suficientemente boas para serem jogadas. Tem um jogo de condução onde se corre por plataformas e um jogo de futebol divertido. Possui uma onda assim minimalista, caseira e estranha. Eu adoro Sonhos generosos, onde se sente que não era necessário oferecer-nos tantas coisas, mas foi exatamente isso que os criadores fizeram!

Uma captura de ecrã de Defender Imp.

Uma captura de ecrã de Defender Imp.

O número dois é Defender Imp!, que é um jogo de tiros clássico em estilo moderno. Quem me dera que houvesse mais jogos em Dreams como este, dado que possui um design económico, o que o torna perfeito para Dreams. Eu sei que é o que está na moda hoje em dia, mas eu adoro quando um criador cria um design que lhe facilita a tarefa. Fácil de fazer a depuração, fácil de testar, fácil de jogar - tipo, não é preciso criar um milhão de recursos lindos. Basta ter um design inteligente e bem executado, e eu adoro este tipo de designs de Pesquisa e Desenvolvimento simples. E isso é um exemplo perfeito do meu tipo de criação preferida, por isso, bom trabalho Sharfik1995.

Uma imagem de Grapple Swing Platformer.

Uma imagem de Grapple Swing Platformer.

A minha recomendação final é Grapple Swing Platformer de Agent_C0w161. Esta criação é de 2021, e possui uma mecânica com um gancho bastante restrita, em que o gancho só pode ser ancorado em pontos fixos - mas o balanço é tão cinemático, e ao mesmo tempo tão livre, que acaba por ser muito gratificante. Não é muito complexo, só se joga no papel de uma pessoa em forma de cubo. Mas a forma como nos balançamos de forma elegante por toda esta geometria, juntamente com a qualidade cinemática, faz-nos sentir que somo um Nathan Drake em forma de cubo, a balançarmo-nos com este gancho, apesar de ser um cubo bastante estático.

Não é tão bem orquestrado como Uncharted, o que lhe dá uma sensação ainda melhor, porque o jogador sente-se mesmo bem quando consegue usar perfeitamente a mecânica. Tem tudo uma fluidez muito natural. É do género, EU tenho de premir o botão e EU tenho de apontar, em vez de ser o jogo a fazer isso por mim. Por estas razões, Grapple Swing Platformer é, pessoalmente, a minha joia oculta. Isto, se ainda for possível considerar uma joia oculta algo que tiver sido jogado umas 500 vezes!

O Guia de Utilizador do Dreams é um trabalho em progresso. Fica de olho nas atualizações, à medida que adicionamos mais recursos de aprendizagem e artigos.